Um dia sonhei com Paulo. Ele vestia preto e no meu sonho estava de costas. Naquele sonho ele gritava. Gritava e pedia que eu me lembrasse da força que existia em mim. “Você se esqueceu da força que tem?” ele perguntava repetidas vezes. “Você se esqueceu de quem é?”. Eu tinha me esquecido e apesar de despertar mais atenta eu continuei a me esquecer das coisas sobre mim. “Você pode arrastar tudo se quiser”. Eu me esqueci de que eu era mais forte que as circunstâncias que tentavam me aprisionar.
E hoje não em sonho, mas em vida, como quem surge do mundo dos mortos, você aparece vestido de preto, como Paulo, para me dizer que fui humilde demais. Que aceitei muita coisa. Que eu deveria ter me levantado e virado a mesa. Que eu devia ter gritado e sido impiedosa com quem foi impiedoso comigo.
Você aparece e me diz que fui boa demais. Que eu aceitei me aprisionar, enquanto tinha a força para arrebentar tudo se eu quisesse. Hoje você vem com estes olhos, que são só seus, e me diz que eu deveria ter dito verdades ríspidas no lugar de silenciar. Que eu deveria ter saído de mim e me tornado tudo que sou.
Hoje você me vem e diz que admira a força quando ela é sincera e incisiva e pede que eu seja sincera ao dizer o que acho de tudo. Que o silêncio não me cai bem. Você vem e me diz que eu deveria dar-lhe um tapa, o tapa que nunca dei em quem quase acabou comigo. Que você merece isso por ter me deixado tanto tempo à mercê da sorte.
Hoje você vem e me abraça com a tua escuridão. Diz que devo ser cautelosa ao confiar. Hoje você vem e me veste de noite para que eu veja a luz das estrelas guias.
Texto de Vanelli Doratioto.
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